No dia 29 de Abril de 1974, na Cooperativa
Esteiros, que sucedera em Lisboa à Cooperativa Devir, encerrada por decreto
do Marcelismo, travei conhecimento com António Dias Lourenço,
histórico dirigente do PCP, protagonista da mais audaciosa fuga das cadeias do
regime fascista, ao atirar-se da muralha do Forte de Peniche para o mar, em
plena noite, em 3 de Janeiro de 1960. Em 26 de Abril de 1974, Dias Lourenço foi libertado da prisão hospital de Caxias. Conversámos
sobre os fantásticos acontecimentos que estávamos a viver e eu fiquei espantado
como é que um homem que passara os últimos doze anos na cadeia – após a segunda
prisão em 1962 – tinha tanta informação e juízos tão claros e firmes.
Ao despedirmo-nos, António Dias Lourenço chamou-me à parte e perguntou-me
se poderia utilizar a minha casa para fazer, ou receber, não percebi bem, uma
chamada telefónica de longa distância que requeria discrição e privacidade.
Forneci-lhe a minha morada e não falei do assunto a ninguém. Até hoje.
Ao fim da tarde
bateram à minha porta. Os meus filhotes retiraram-se com a mãe para o primeiro
andar da casa de bairro das Calçada dos Mestres e eu fui abrir. E abrindo a
porta vi à minha frente António Dias Lourenço e ainda Octávio Pato, Joaquim
Gomes e creio que também Carlos Brito e/ou Rogério de Carvalho, ou seria
outro dirigente do PCP, talvez Jaime Serra, que eu não identifiquei, enquanto
os restantes já tinham aparecido em público, designadamente ao serem recebidos
pela Junta de Salvação. Informei-os que os meus filhos e mãe estavam no
primeiro andar e não desceriam até que eu os chamasse mas acrescentei que nesse
andar ficava a casa de banho, pelo que em caso de necessidades, era melhor
falarem primeiro comigo. E saí para o quintal.
Passadas talvez duas horas chamaram por mim: iam sair. António Dias
Lourenço teve a amabilidade de agradecer e de me comunicar a grande decisão
daquela reunião realizada em minha casa e do contacto internacional que tinham
feito através do meu telefone:
- O Camarada chega
amanhã.
-…
- O camarada Álvaro… chega
amanhã.
E chegou, Álvaro
Cunhal chegou a Lisboa a 30 de Abril de 1974.
Lisboa, 11 de Junho de 2015
Álvaro Cunhal a desembarcar em Lisboa, acompanhado por Domingos Abrantes e
Conceição Matos, encaminhado pelo funcionário do aeroporto José Duarte.
"Um, dois... um, dois, três, quatro, cinco minutos de jazz" é da extracção de 1966, mais antigo que a
democracia em Portugal.
Cunhal à chegada a Lisboa, em cima de um tanque,
como Lenine no regresso do exílio.
Em redor de Cunhal reconhecem-se: Severiano Falcão, Dias Lourenço,
Mário Soares, Joaquim
Gomes, Rogério de Carvalho e o major Jaime Neves,
que comandou a operação de segurança.
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