Rádio Renascença 1962 |
1962
– Entrei na rádio pelo Programa Nova Vaga, com outros jovens
de então, nas tardes de sábado de Rádio Renascença: Fernando Correia (actual
membro do Conselho de Opinião), João Mota, Lauro António, Dinis de Abreu,
Daniel Ricardo, Maria do Céu Guerra e João Paulo Guerra. Programa de microfone
aberto em directo para o gravador do José Manuel Moreno Pinto. Foi assim: o
Dinis de Abreu, jovem jornalista no Diário Popular, formou a equipa e perguntou
a minha mãe, Maria Carlota Álvares da Guerra, chefe de redacção da Crónica
Feminina e cronista na RR, se conhecia jovens que quisessem participar no
programa: entrei eu e a Maria do Céu, minha irmã; eu acabei por ficar na rádio,
a Maria do Céu Guerra foi para o teatro.
Quando a Nova
Vaga acabou – e foi rapidamente – Joaquim Pedro convidou-me para ficar a estagiar
como locutor na RR. Lia anúncios de estação – Rádio Renascença, Emissora Católica Portuguesa –, ligações e
lançamentos entre programas, passagens à Basílica dos Mártires para o Terço e
Bênção, o estágio era acompanhado por locutores consagrados da estação como Joaquim
Pedro, Dora Maria, Maria José Baião, Luís Filipe Aguiar. Também “estagiava”
vendo fazer e ouvindo João Martins, Armando Marques Ferreira, António Revés, e
observando de perto o trabalho de técnicos como José Manuel Moreno Pinto,
Alberto Moreno, José Ribeiro, António Ricardo.
Em
1963,
um ano após o início do estágio, recebi convite para me mudar para o Serviço de
Noticiários do Rádio Clube Português. Na RR
eu também dava notícias – recortadas dos jornais e coladas numa folha de papel:
“O Senhor Presidente do Conselho recebeu
hoje o senhor ministro da Defesa com quem o vemos na gravura acima”. De
maneira que aceitei de primeira o convite, vindo do Luís Filipe Costa e
transmitido pelo Matos Maia. O último acto em que participei como estagiário da
RR foi um jogo de futebol contra o RCP. Perdemos.
Entrei para o RCP em Outubro de 1963 – descontei desde essa data para a Segurança
Social, mesmo no tempo em que estive no serviço militar, em Portugal e
Moçambique, pois o RCP procedeu sempre aos descontos. Soube-o quando pedi a
contagem da minha carreira contributiva para a Segurança Social.
Mary entre Álvaro Jorge e Jorge Alves |
Fiz prova para admissão no RCP, Jaime da Silva Pinto e Júlio César
(pai) aprovaram-me, escrevi e li o primeiro noticiário a tremer, com a Dona
Mary – figura lendária do RCP e da
rádio – a fazer a locução de continuidade e tricot, olhando para mim por cima
dos óculos. Eu tremia e as folhas do noticiário também. Foi no horário das duas
da tarde no qual a Mary certo dia se enganou nas chaves e botões que tinha ma
mesa de locução, carregou no botão do intercomunicador e anunciou: Rádio Clube Português, Parede, Portugal;
depois abriu a chave do microfone e deu ordens para a central técnica: Ó Grilo, mete o Tide. No RCP encontrei a
equipa dos Noticiários constituída por Luís Filipe Costa, Justino Moura Guedes,
Paulo Fernando, João Macieira de Barros (que estava de saída para o serviço
militar), Cândido Mota, Firmino Antunes (no desporto); depois foram chegando
Jorge Dias, Jorge Moreira, Manuel Bravo, Fernando Quinas.
Luís Filipe Costa |
Os Noticiários do
RCP, sob a chefia de Luís Filipe Costa deram a volta ao texto e à atitude dos
noticiários da rádio: linguagem directa, frase simples, período curto, sentido
do imediato, ordenação e selecção das notícias pela respectiva importância. O Luís Filipe Costa ensinava-nos sem nos dar lições. Aprendíamos, fazendo; e toda a gente da rádio aprendeu com o Luís Filipe Costa mesmo os que hoje não saibam quem é o Luís Filipe Costa.
Estive dez anos nos Noticiários do RCP,
incluindo os dois anos de tropa: comecei com o assassínio de John Kennedy, a
escalada da Guerra do Vietnam, a explosão do rock ‘n rol, o Maio de 68, a doença,
sucessão e a morte de Salazar, o golpe no Chile e assassínio de Allende.
Noticiaristas do RCP meio século depois: Paulo Fernando, João Macieira de Barros, Luís Filipe Costa, JPG, Cândido Mota e Manuel Bravo |
Em Outubro de 1973 recebi a medalha de 10
anos de bons serviços; no mês seguinte fui despedido. Pressões do SNI: eu
participara num colóquio sobre Liberdade de Imprensa no âmbito da “campanha
eleitoral” de 1973.
1963
– 1973 – Há mais rádio e outros meios para além do RCP. Entre 63 e 73, trabalhando nos Noticiários
do RCP e colaborei em diversos jornais e programas de rádio: escrevi no
suplemento A Mosca, do Diário de Lisboa, suplemento Cena 7, de A Capital, A Memória do
Elefante, fui locutor e repórter nos programas PBX (1967 – 69), na Onda
Média do RCP, meia-noite às duas, e
no Tempo Zip (1971 – 1972), OM da RR,
do qual cheguei a ser realizador no último ano de vida do programa. As equipas
de ambos os programas foram distinguidas com Prémios da Imprensa, em 1968 e
1972. Neste ano, no Teatro São Luiz, tive
a honra de receber o troféu da rádio com José Afonso, Prémio de Música.
Fialho Gouveia e Carlos Crus |
O PBX
foi a revolução na rádio lançada por Carlos Cruz e Fialho Gouveia mas também
pelo José Nuno Martins – a linguagem, a comunicação e a técnica, a montagem quase
cinematográfica das reportagens –, como pelos sonoplastas Luís Alcobia,
Fernando Jorge, António Ricardo, José Ribeiro e Alberto Moreno (no PBX), os mesmos, mais José Videira no Tempo Zip. O programa de rádio seguiu-se
ao grande êxito de televisão Zip Zip,
realizado por Carlos Cruz, Fialho Gouveia e Raul Solnado, com José Nuno
Martins. Eu e o Rui Pedro ficámos a fazer o PBX,
após a decisão de Carlos Cruz e Fialho Gouveia se afastarem. Em menos de um ano
saí também e juntei-me à equipa inicial do Tempo
Zip.
Paul McCartney no Algarve, em Dezembro de 1968, entrevistado por JPG (PBX) e João Mendes Martins (Limite) com assistência de Óscar Araújo |
O Tempo
Zip (4 de Abril
de 1970 - 7 de Setembro de 1972) sob a minha realização – com orçamento muito mais limitado – passou a
ser um programa de texto ilustrado com reportagens e música. A equipa tinha mantido
Joaquim Furtado e José Duarte – que não fazia só jazz – e ganho João Alferes
Gonçalves e Luís Bernardo Onwana, jovem novelista moçambicano autor de Nós Matámos o Cão Tinhoso e criativo
numa agência de publicidade. Também conservámos analistas da equipa inicial do Tempo Zip.
Tempo Zip no ar, a bordo de um Caravelle, 29 de Março de 1970: José Nuno Martins entrevista Maria Teresa Horta |
A rádio trabalha para auditórios sem rosto
mas o Tempo Zip tinha um ouvinte
personalizado, D. António Ribeiro, Patriarca de Lisboa desde Maio de 1971. Por
vezes, D. António passava à noite pelos estúdios da RR, falava com as pessoas,
assistia à realização dos programas, fiz emissões do Tempo Zip com D. António sentado do outro lado da mesa de locução.
Ele também fora um homem da comunicação e grande comunicador e creio que essa
vocação não lhe passou. Em algumas noites, quando transmitíamos reportagens fortes
sobre temas sociais – habitação degradada, baixos salários, despedimentos, condições
de trabalho e de vida – telefonava-nos o secretário do Patriarca: Ouvimos e apreciámos; continuem!
O Tempo
Zip acabou em Setembro de 1972.
Quando a organização Setembro Negro
sequestrou e matou 11 atletas da equipa olímpica de Israel, o Tempo Zip tinha um enviado em Munique
para seguir os JJOO. Mas resolvi acrescentar à reportagem do enviado, especial
naquele dia, um editorial do Adelino Gomes que fora visado pela Censura e
transmitido no programa Página 1. A
repetição foi o motivo para a Secretaria de Estado da Informação e Turismo (SEIT,
ex-SNI) exigir o meu despedimento aos produtores do programa, procedendo de
igual modo quanto a Adelino Gomes e ao Página 1. Ou os produtores aceitavam
despedir os dois jornalistas ou os programas cessavam, tais foram as exigências
apresentadas pelo funcionário do Palácio Foz Pedro Feytor Pinto. Sei o que se
passou no meu caso: os produtores do Tempo
Zip, Organizações Zip Zip
associadas à editora Sassetti,
recusaram a exigência do Governo e o programa terminou; o Adelino Gomes foi
despedido.
Prémios da Imprensa 1972: José Afonso (Prémio da Música), entrevistado para o Notícias da Amadora por José Freire Antunes, Mário Reis (então livreiro, agora na restauração), JPG (Tempo Zip) |
Na sequência deste caso, o director-geral da
Informação, Geraldes Cardoso, dirigiu uma carta a todas as estações de rádio,
alertando que Adelino Gomes e João Paulo Guerra, despedidos de programas na RR,
procurariam eventualmente trabalho. Do ponto de vista governamental, não era
conveniente dar-lhes abrigo. Li a carta dois anos mais tarde, quando me foi
mostrada pela direcção militar da Emissora
Nacional, após o 25 de Abril.
Um ano após a carta de Geraldes Cardoso fui
despedido dos Noticiários do RCP, por
um motivo fútil, o de ter participado numa sessão sobre liberdade de imprensa promovida
pela CDE e integrada na campanha, pública e legal, para as “eleições” de 1973.
Eu escrevia e continuei a escrever. Durante
o serviço militar em Moçambique escrevi para jornais de Moçambique e escrevi para
a revista do RCP, Antena, uma reportagem sobre a guerra: "Tentarei dar aos leitores de 'Antena' um
aspecto concreto da guerra que se processa no Norte de Moçambique. Escolhi para
tal esta operação [deslocação de uma companhia de caçadores, reforçada com
um destacamento de Engenharia, no Niassa, partindo de Vila Cabral para se
instalar na povoação de Olivença], em que participei como alferes
miliciano, atirador de infantaria e que tentei observar com a frieza e isenção
de noticiarista."
De maneira que saí do RCP num dia do final de Novembro
de 1973 e no dia seguinte estava a trabalhar no projecto de um novo
semanário.
No entanto…
(continua)
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