Obviamente, demito-o! |
O general Humberto Delgado foi
assassinado em 13 de Fevereiro de 1965.
O regime de Salazar não permitiu que o
general chegasse ao termo do mandato do seu opositor, Américo Thomaz, nas eleições roubadas de 1958. Em 1965 havia eleições presidenciais e a memória da campanha de
1958 atormentava o regime. Salazar prevenira-se contra a repetição do susto que
apanhara em 1958 mudando as regras do jogo: o sucessor de Américo Thomaz seria
escolhido por um colégio eleitoral reservado aos círculos íntimos do poder.
Mas
o irrequieto «general sem medo» continuava a conspirar, atormentando a rotina
de Salazar e do regime. Porém, o percurso do general estava armadilhado e a
denominada Operação Outono,
autorizada por Lisboa e planeada a partir de Roma, estava em marcha acelerada.
Em Fevereiro de 1965, o general Humberto Delgado avançou para Badajoz, ao
encontro de supostos oposicionistas ao regime, na verdade um encontro com a
PIDE e com a morte.
A campanha |
1965, 24 de Fevereiro -
Citando um porta-voz do general em Argel, a AFP diz que Delgado «terá sido
preso em Espanha no dia 14 de Fevereiro».
18 de Março - A France Press, em
despacho datado de Caracas, cita
parlamentares venezuelanos do Comité para a Libertação de Portugal que falam,
pela primeira vez, da possibilidade de Humberto Delgado ter sido assassinado. O
general teria sido preso pela Guarda Civil, em Badajoz, a 14 de Fevereiro, e
entregue à PIDE que o teria assassinado. A agência acrescenta que o governo de
Lisboa desmente «categoricamente» que agentes da polícia portuguesa se tivessem
deslocado à região de Badajoz nos últimos tempos.
21 de Março - A Agência
Nacional de Informação (ANI) põe a
circular que Delgado se encontra em Praga, «quase prisioneiro», em
regime de «exílio forçado». Segundo a ANI, o general preparar-se-ia para
reaparecer numa capital europeia e declarar que se evadira de uma prisão
portuguesa.
O outro lado da campanha |
22 de Março - O
correspondente da Associated Press em Lisboa admite que Delgado prepare uma
acção espectacular num ano de eleições presidenciais e legislativas.
O jornal espanhol ABC
escreve que o general se encontra em Praga, a fim de ser submetido a uma
cirurgia plástica destinada a alterar-lhe o rosto.
23 de Março - A AFP obtém
uma declaração oficial da Embaixada de Portugal em Roma: as autoridades
portuguesas declaram-se completamente alheias ao desaparecimento de Delgado.
27 de Março - A Reuter
torna pública uma declaração do porta-voz do Ministério da Informação de
Espanha: Madrid nega que a polícia espanhola tenha prendido o general Humberto
Delgado. E a AFP cita «círculos da oposição portuguesa no Rio de Janeiro»,
segundo os quais o general estaria preso no Forte de S. Julião da Barra, perto
de Lisboa.
12 de Abril - A UPI cita
o correspondente em Milão do jornal La Suisse: Delgado teria sido submetido a
uma intervenção cirúrgica em Roma e estaria em convalescença numa clínica de
Milão. A polícia milanesa teria mesmo lançado uma operação de busca «a fim de
proteger o general de um eventual atentado».
25
de Abril – Os corpos de Humberto Delgado e de Arajarir Campos são encontrados
por um pastor em Malos Pasos, perto da fronteira portuguesa. As autópsias vêm a revelar que a morte do general
resultou de lesões cerebrais provocadas pelo impacto e trajecto de balas.
Arajarir Campos apresentava fracturas das vértebras cervicais, atribuindo-se a
morte a estrangulamento.
Segundo
o historiador espanhol Juan Carlos Jimenez, os corpos teriam sido descobertos e
identificados no dia 4 de Abril, tendo as autoridades de Madrid procedido a uma
«encenação» para atrasar a revelação do crime, preservando assim os interesses
das autoridades de Lisboa.
Malos Pasos |
O Diário da Manhã
interroga-se: «Delgado teria sido assassinado pelos comunistas?».
Mário Soares e Abranches Ferrão são constituídos advogados da família do general.
29 de Abril – O Século e
a República publicam textos idênticos anunciando o aparecimento de um cadáver,
junto à fronteira, que se supunha ser de Humberto Delgado, e admitindo que o
general podia ter sido executado pelos comunistas.
30 de Abril - A AP cita o Diário da Manhã,
órgão da União Nacional, segundo o qual o general teria sido vítima «dos
comunistas, de agentes da Índia que ocuparam Goa, ou do rebelde anti-angolano
Holden Roberto». Em despacho de Madrid, a AFP acrescenta que o governo espanhol
nega que tivesse conhecimento da estadia do general em território espanhol.
4 de Maio - A Reuter revela que a viúva de
Humberto Delgado, acompanhada pelo seu advogado, Mário Soares, se deslocou a
Badajoz, onde terá prestado esclarecimentos com vista à identificação do corpo
do general.
8 de Maio - A AFP divulga um comunicado
oficial, em Madrid: o juiz encarregado da instrução do processo identificou um
dos corpos como sendo o do general Humberto Delgado.
23 de Junho – A União Nacional anuncia a
candidatura do almirante Américo Thomaz à Presidência da República.
25 de Julho – Um colégio eleitoral,
constituído pelos deputados da Assembleia Nacional e os procuradores da Câmara
Corporativa, elegem, com 13 votos nulos, o almirante Américo Thomaz para novo
mandato presidencial.
14 de Agosto - A partir de Madrid, a AFP diz
que o advogado espanhol Mariano Robles, que acompanhou Mário Soares numa visita
a Badajoz, vai reclamar a abertura de um inquérito internacional a fim de
«esclarecer o papel de certos funcionários portugueses» no assassínio do
general.
5 de Novembro - Salazar fala ao país pela rádio e televisão,
abordando, pela primeira e única vez em público, o caso Delgado. Na véspera das
eleições para a Assembleia Nacional, o chefe do governo aproveita para afirmar
que a morte de Humberto Delgado «só poderá ter aproveitado à oposição
portuguesa».
AMANHÃ: A PIDE
não conspirou sozinha
João Paulo Guerra em Diário Económico, Fevereiro de 1998,
nos 40 anos da campanha do general Humberto Delgado
não conspirou sozinha
João Paulo Guerra em Diário Económico, Fevereiro de 1998,
nos 40 anos da campanha do general Humberto Delgado
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